JORNAL NOTÍCIAS DO DIA (4/5/2018)

Contrariando lei estadual, Detran notifica motoristas sobre cassação de carteiras
Alegando inconstitucionalidade da lei, órgão de trânsito cobra infratores com 20 pontos na carteira acumulados em um ano, de 2012 a 2017
A lei 17.403/2017 aprovada no final do ano passado pela Alesc (Assembleia Legislativa de Santa Catarina) e sancionada pelo então governador Raimundo Colombo (PSD) determina que a suspensão da CNH (Carteira Nacional de Habilitação) ocorra no mesmo ano em que o motorista acumular 20 pontos. No entanto, o Detran/SC (Departamento Estadual de Trânsito) não acatou a lei. O órgão notifica condutores que alcançaram essa pontuação, mas durante o período de cinco anos, entre 2012 a 2017.
O governo do Estado entende que o Detran deve cobrar o infrator no mesmo ano em que acumulou os 20 pontos e, se o órgão de trânsito não fizer isso, essa pontuação teria de ser anulada. Por isso, o autor do projeto de lei, deputado estadual Gelson Merísio (PSD), já pediu explicações ao Detran.
“Não cabe nem ao Detran nem a nenhum outro órgão do governo descumprir a lei. Isso é crime praticado contra a legislação catarinense”, afirmou Merísio à RICTV Record. Ele disse ainda que, para entrar em vigor, a lei deve ser aprovada na Alesc, sancionada pelo governador e publicada, e os três requisitos foram cumpridos.
Conforme o deputado, quase 1 milhão de motoristas notificados de 2011 a 2015 não tiveram aplicação quando previa a legislação. “Agora, são penalizados de forma dupla, pois já pagaram a multa e não podem ficar com uma espada na cabeça por cinco anos”, criticou.
Por sua vez, o Detran afirma que o número de motoristas no Estado que atingiram os 20 pontos acumulados em 12 meses, entre 2012 e 2017, passa de 600 mil. Segundo o diretor Vanderlei Olívio Rosso, muitas são infrações gravíssimas e não podem ser abonadas. Para Merísio, o Detran é um órgão estadual e deve se submeter às leis do Estado. “Se entendem de forma diferente devem buscar vias junto ao Poder Judiciário para declarar a lei inconstitucional, o que não acredito que ocorra porque estamos regulando relações administrativas do Detran com o contribuinte. Não estamos legislando sobre trânsito, portanto a lei tem que ser cumprida e quem não o fizer terá que ser punido criminalmente”, afirmou.

Governo federal alerta MP-SC
Ainda sobre a legislação, o Ministério da Cidades encaminhou documento ao MP-SC (Ministério Público de Santa Catarina) no dia 22 de janeiro deste ano, falando da inconstitucionalidade da lei 17.403. O ministério mostra ainda que o Contran (Conselho Nacional de Trânsito), órgão máximo normativo e consultivo do sistema nacional de trânsito, editou uma deliberação (163/2017) que dispõe sobre a uniformização dos procedimentos administrativos para imposição das penalidades de suspensão do direito de dirigir e de cassação da CNH, além de cursos de reciclagem. Dessa forma, a lei estadual estaria ferindo também o princípio de autonomia do Contran.

Departamento de Trânsito cita inconstitucionalidade

Em ofício encaminhado à PGE (Procuradoria Geral do Estado), Vanderlei Rosso explica que a norma estadual seria mais benéfica com infratores que, por ventura, tenham recebido a penalidade próxima do final do ano em questão. Por exemplo, se a pessoa recebe a notificação no dia 30 de dezembro, o órgão de trânsito teria apenas até o dia seguinte (31 de dezembro) para instaurar o processo, contrariando a legislação vigente que prevê prazo de prescrição de cinco anos (resolução 182/2005 Contran c/c deliberação nº16/3/2017).
Além disso, o Detran também alega que a lei estadual é inconstitucional por afrontar o artigo 22, inciso 11, da Constituição. O artigo dispõe que compete privativamente à União legislar sobre matéria relacionada ao trânsito e ao transporte e prevê que Estados e municípios só poderiam legislar sobre esses temas se a União os autorizar por meio de lei complementar. Esse também é o entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal), que já teria se manifestado várias vezes sobre essa discussão.
Gelson Merísio disse que os motoristas podem buscar ajuda por meio judicial, mas que isso não deve ser necessário porque “o Detran deve cumprir a lei”. “É evidente que temos que ter um trânsito seguro, mas a aplicação no tempo correto é a forma de o motorista ter cautela e mais cuidado na condução”, afirmou.

Confira a reportagem sobre o assunto na RIC TV, com menção à PGE/SC:
 goo.gl/cx9XcQ